A Esteva: Uma guerreira solitária do Alentejo Litoral

A Esteva (Cistus ladaniferus), é uma planta arbustiva nativa da região mediterrânea, com presença marcante no Alentejo Litoral. Adaptada à aridez e à salinidade do solo costeiro, esta espécie resiliente prospera em paisagens agrestes, adornando-as com sua beleza rústica e aroma doce a madeira e a terra inconfundível.

O nome de “cistus” vem do grego que significa cesto, devido ao facto de os seus frutos serem cápsulas globosas com 7 a 10 compartimentos (caixas).

No Alentejo Litoral, a Esteva esconde-se entre outros tantos arbustos iguais e parecidos, todos eles com ramagem verde desorganizada mas, na primavera, entre março e abril, ela revela-se em toda a sua beleza.

Num curto período, por volta de abril, a Esteva reproduz-se intensamente. As flores nascem na parte baixa dos arbustos e morrem no dia seguinte, apenas para serem substituídas por novas flores na parte superior, repetindo o ciclo até o fim da floração.

Cada flor divide-se em cinco pétalas brancas, algumas com manchas arroxeadas que lembram uma estrela. Outras, mais simples, são brancas por fora e com o sol no centro. Têm caules e folhas muito pegajosas que se agarram à roupa e à pele. Esta característica pegajosa deve-se à alta concentração de um constituinte resinoso – o ládano.

A família é grande e a variedade também: conhecidas por Esteva ou Xara – pétalas brancas ou com uma mácula púrpura na base de cada uma das pétalas e folhas com nervuras pouco visíveis, a Estevinha/Sargaço/Sanganho mouro – são de pétalas brancas e as nervuras bem visíveis na parte superior das folhas, a Roselha-grande – pétalas rosadas a púrpura, e tantos outros, conforme quem os disser e onde….

Uma Planta Emblemática do Sul

No Baixo Alentejo e Algarve, a Esteva assume um papel de destaque na biodiversidade local. Nos seus campos floridos, principalmente na primavera, com tons de branco e rosa, atraem polinizadores como abelhas e borboletas com as suas flores vibrantes contribuindo para um equilíbrio ecológico essencial.

Mais do que um simples elemento decorativo, a Esteva é profundamente ligada à cultura e tradições da região, sendo utilizada de diversas maneiras há séculos.

Usos Tradicionais e Propriedades Benéficas

A Esteva possui diversas propriedades benéficas que a tornam uma planta valiosa para a medicina popular e a indústria cosmética.

De suas folhas e flores, extrai-se o ládano, o óleo essencial que é utilizado na aromoterapia para combater o stresse.

Cicatrização de feridas – O Ládano e o óleo essencial presente na flor da Esteva, apresentam um efeito inibidor do crescimento bacteriano reconhecido cientificamente. Ao inibir o desenvolvimento de micro-organismos e a criar um efeito de revestimento sobre as feridas, estamos a criar as condições ótimas e necessárias para que pele se regenere naturalmente.

Anti-inflamatório – A presença de compostos naturais anti-inflamatórios na Esteva e no seu óleo essencial, fazem destes um complemento interessante no tratamento de inflamações das articulações e da pele.

Além do ládano, a Esteva também é integralmente utilizada no preparo de chás:

Digestão e Estômago – O chá de Esteva é também utilizado para promover uma maior bem-estar digestivo, particularmente no alívio e reparação da gastrite e de úlceras gástricas e do duodeno.

Tratamento de diarreias – O efeito adstringente, novamente associado às propriedades antimicrobianas, faz da Esteva uma boa alternativa no tratamento de diarreias, principalmente as de origem bacteriana ou viral. 

Reforço do sistema imunitário – Tradicionalmente esta planta tem sido ainda utilizada no combate a gripes e constipações, atuando principalmente como expetorante e antisséptico das vias respiratórios.

Insónias e Ansiedade – O consumo do seu chá é referido como um remédio calmante natural, excelente para aliviar o stress e a ansiedade, tal como facilitar o início de uma boa noite de sono.

Antiage – Riquíssima em compostos naturais de efeito antioxidante, a esteva e os seus preparados são excecionais no que consta ao regime de anti idade. Atualmente, já é vastamente utilizada na incorporação de cremes antirrugas para manter uma pele jovem e brilhante.

As suas folhas secas podem ser usadas como especiaria para temperar carnes e peixes, conferindo-lhes um sabor único e mediterrâneo.

Usos antigos destas guerreiras solitárias

  • No passado, este óleo era extraído através do pentear do pelo das cabras que tinham acabado de passar por um esteval.
  • Os usos ancestrais da Esteva incluem a utilização da sua lenha nos fornos de cozer o pão e outros alimentos; para além de ser muito combustível, liberta um agradável aroma.
  • Com fins medicinais e utilizada numa quantidade quase infindável de tratamentos.
  • Ao que parece, alentejanos e algarvios tradicionalmente também usavam o seu óleo essencial para eliminar o mau cheiro dos pés!  E não são poucas as aplicações cosméticas e como fixador de perfumes que se lhe dá, na atualidade.
  • De pétala com sabor suave e adocicado nas suas máculas, as pétalas da esteva são comestíveis, frescas ou desidratadas.
  • A planta é também muitas vezes associada a simbolismos místicos e protetores, acreditando-se que ela possui o poder de afastar o mau-olhado.

Um Símbolo de Resistência e Adaptabilidade

A capacidade da Esteva de prosperar em ambientes áridos e salinos torna-a um símbolo de resistência e adaptabilidade. Esta planta desempenha um papel vital na prevenção da erosão dos solos em áreas mais secas e após incêndios. É um bom indicador biológico da degradação dos solos devido, por exemplo, ao excesso de pastoreio ou à ocorrência contínua de incêndios, sendo esta uma das primeiras plantas a surgir ocupando o espaço onde outrora cresciam azinheiras.

A sua presença nas paisagens costeiras do Alentejo Litoral serve como um lembrete da força da natureza e da importância da preservação do meio ambiente.

A lenda da flor das estevas – Uma lenda muito antiga que chega aos nossos dias!

“Quando Nosso Senhor ia com a cruz às costas, subindo ao Calvário, havia muitas estevas floridas de um lado e do outro, mas todas tinham as flores brancas sem as pintas vermelhas.

Nosso Senhor ia deitando muito sangue da cabeça devido à coroa de espinhos que lhe puseram para fazer pouco dele, por ter dito que era rei, e esse sangue caiu em cima das estevas e manchou as flores.

Mais atrás, ia Nossa Senhora, chorando muito, e caiu uma lágrima de sangue dos olhos dela que também manchou uma flor.

De maneira que as estevas que têm seis “folhas” são as que apanharam o sangue de Nosso Senhor e a lágrima de Nossa Senhora; as que têm cinco só apanharam o sangue de Jesus, para nos lembrarmos das cinco chagas; e as que são só brancas, não apanharam sangue nenhum.”

Planta Protegida

Devido à sua importância ecológica e cultural, a subespécie  Cistus ladanifer subsp. Sulcatus, espécie endémica de Portugal Continental, encontra-se protegida com estatuto de proteção especial pela Directiva Habitats 92/43/CEE do Conselho, de 21 de Maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e de fauna e da flora selvagens.

As flores desta subespécie (Estevinha/Sargaço/Sanganho mouro ) são completamente brancas como de saias brancas rodadas se tratassem a balançar na dança do vento e as nervuras são bem visíveis na parte superior das folhas.

A sua colheita deve ser feita de forma responsável e sustentável, garantindo a preservação da espécie para as futuras gerações.

A Esteva é mais do que apenas uma planta; é um símbolo da resiliência da natureza, da rica cultura e narrativas do Litoral Alentejano.

 

Poema

Digo: Esteva!
Não se cultiva a esteva, é planta brava.
Em latim, chama-se Cistus laudaniferum.
A flor é branca, amarela ao centro
e vaporosa, corra ou não a brisa…
As veredas estão cheias de esteva,
quando pela estrada passo, de automóvel.
Nos campos é vulgar, se abandonados.
Tem um cheiro pungente, masculino, urgente,
que lhe confere ardores afrodisíacos
e nada há de mais fascinante
do que um rol de esteva alentejana.
De resto, há muita esteva, lá não faltam
outras estevas menos agressivas,
como a esteva de flor cor de púrpura,
em tudo uma esteva feminina.

Digo: Esteva!
Sob o sol ardente, pétalas de neve
e uma abelha ao centro
e folhas verde-escuro, túrgidas de láudano.

Se queres subir ao céu,
põe o pé na esteva, a mão no sargaço:
Ala que é palhaço!

Ruy Cinatti

 

 

Fontes e Fotos:

https://flora-on.pt

https://www.biodiversity4all.org

https://www.ervasemezinhas.pt/pt/mais-defesas/585-cha-de-esteva.html

https://alentejoturismo.pt/a-esteva-uma-valente-solitaria/